Breve História do Montanhismo

A febre esportiva
A década de 1990 viu o boom do Campo Escola 2000 (RJ) e da Serra do Cipó (MG), áreas de escalada esportiva que expandiram o décimo grau. Este nível foi atingido em parte, graças ao surgimento de numerosos muros de escalada, alguns montados dentro de quartos, e à popularização do boulder, atividades que se tornaram praticamente obrigatórias na vida dos escaladores que queriam evoluir técnica e fisicamente.

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Helmut Becker na via Coquetel de Energia (Xc) no Campos Escola 2000, na Floresta da Tijuca (Rio de Janeiro). Foto Ricardo Linhares.

Esta foi a década da escalada esportiva. Antônio Paulo Farias, em um artigo para a revista Fator2 (nº 14, 2001), descreveu bem este período: “Ao longo dos anos 1990 alastrou-se a febre da escalada esportiva em vários pontos do País. A escalada tradicional foi quase que colocada de lado, muitas vias caíram no esquecimento (…). Era o tempo onde os escaladores andavam com calças de lycra coloridas e apertadas (…). Muitos escaladores que tinham uma visão mais global e escalavam de tudo, estavam apreensivos por medo da escalada tradicional desaparecer (…). Felizmente isso não aconteceu”.

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A via Sinos de Aldebarã, na Serra do Cipó (Minas Gerais).

Como resultado desta febre, em 1995, oito anos depois da passagem de Güllich pelo Rio, Luis Claudio “Pita” encadeou a Via do Alemão (Southern Confort), na Pedra do Urubu, o primeiro Xa do Brasil. Tempos depois, Alexandre Galvão e Ralf Côrtes também a encadearam. Em 1996, Helmut Becker e Luis Cláudio “Pita” abriram a Coquetel de Energia, um Xc, no Campo Escola 2000, na Floresta da Tijuca. Esta graduação equivale ao 5.14a norte-americano, um mito para os escaladores brasileiros. Dois anos depois, e após muitos exercícios específicos, Helmut conseguiu fazê-la sem quedas. Na época, era o único 5.14a da América do Sul.

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Luis Cláudio ´Pita´ na Via do Alemão (Xa), na Pedra do Urubu, Urca. Arquivo Luis Cláudio ‘Pita’.

Sinônimo para escalada esportiva também é a Serra do Cipó, a apenas 100 km de Belo Horizonte, que ainda atrai escaladores de todo o Brasil. Com uma rocha de excelente qualidade (mármore), vias de grande dificuldade e imensos negativos, o Cipó era a Meca da escalada esportiva brasileira. Foi lá, inclusive, que as mulheres atingiram a dificuldade de IXc, com o encadeamento da via Heróis da Resistência, pela carioca Mônica Pranzl e pela paranaense Vanessa Valentim. Aliás, não era só na escalada esportiva que as mulheres se destacavam. Nessa época também, a carioca Katia Torres já havia escalado, inclusive guiando algumas enfiadas, as vias Oitavo Passageiro (8º VIIIb A1, 380m), no Corcovado, e a Crazy Muzungus (A2 VI, 600m), no Garrafão, um big wall de vários dias. Depois dela, veio a paranaense Roberta Nunes, uma escaladora bastante completa, que escalava oitavo grau em esportivas e também vias imensas na Patagônia, Yosemite e Groelândia, onde conquistou, com a espanhola Cecilia Buil, uma via de 1.620m de extensão. Roberta faleceu prematuramente em 2006, em um acidente de carro, aos 34 anos de idade.

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Cleanto Portilho num dos vários boulders abertos na Urca a partir do final da década de 90.

Depois do Campo Escola 2000 e da Serra do Cipó, foi a vez da Barrinha se tornar o novo point da escalada esportiva após sua descoberta, em 2000, por Antônio Paulo e Luis Claudio “Pita”. Com vias de até 30 metros e várias dezenas de movimentos, a Barrinha é hoje o local com o maior número de vias de décimo grau e por onde passaram alguns dos melhores escaladores esportivos dos País. Eles foram protagonistas de performances impressionantes, como o encadeamento, já na primeira tentativa, em flash, da via Vaca Louca (Xb), pelo gaúcho Guilherme “Guili” Zavaschi; da via Chapa Quente (Xa), pelo também gaúcho Thiago Balen; e da via Barra Pesada (Xa), pelo paranaense Diogo Ratacheski. Já o canadense Scott Milton passou à vista na primeira parte (Xa) da via Lágrimas de Sangue.

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Allan Rodrigues, na via Mr. Bill, Xc, (Barrinha, Rio de Janeiro). Foto Rodrigo Mensch.

Espantoso também foi o que aconteceu em 2003: em um único dia, Daniel Hans “Coçada” encadeou, sacando as costuras, as vias Mr. Bill (Xc), Lágrimas de Sangue (Xb), Vaca Louca (Xb), Barra Pesada (Xa), Filezão (IXc), Crux com certeza (IXb), Espetinho (IXa/b) e Filé com certeza (IXa). Haja resistência!
Junto com a escalada esportiva, crescia também no Brasil o número de escaladores se dedicando aos boulders. No Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Brasília, novas áreas e novos boulders foram sendo descobertos. Isso fez com que alguns escaladores praticamente deixassem a corda de lado, tornando-se especialistas nessa modalidade.